30 de out. de 2012

Atores trocam experiências sobre a produção teatral no projeto Pensamento Giratório da Mostra Guajajara

Um momento para trocar experiências e discutir o processo de produção teatral entre os grupos convidados da VII Mostra SESC Guajajara de Artes e a comunidade artística local. Essa foi a proposta do Pensamento Giratório, encontro que promoveu o debate com as atrizes Iara Campos e Juliana Montenegro, da Trupe Ensaia Aqui e Acolá (PE), na segunda (29), no Chico Discos Bar.




A iniciativa faz parte das ações formativas da programação da Mostra deste ano. “O pensamento giratório é um momento importante dentro do Palco Giratório que, na verdade, é um processo de mediação e de troca. É quando paramos um pouco das atividades artísticas para discutirmos o processo criativo da cada grupo, a questão do mercado e da difusão das artes. Então, acaba sendo um momento de abraço mesmo entre a gente”, explicou Carol Aragão, técnica de Cultura do SESC.

A professora do Departamento de Artes da UFMA, Socorro Braga, mediou o debate e fez considerações a respeito do trânsito que há entre o processo acadêmico e o fazer teatral, ressaltando que é preciso que a academia e os grupos dialoguem entre si, buscando intervir em ambos os espaços, o da produção científica e o da produção teatral.

Entre os participantes do debate, estavam alguns integrantes da Companhia Santa Ignorância de Artes (MA), da Companhia Druw de Dança Contemporânea (SP), profissionais e estudantes de teatro e aspirantes à carreira de ator, que fizeram considerações a respeito da experiência de circular por diversos estados, das diferentes realidades de espaços culturais e dos grupos presentes na programação. Para o bailarino Anderson Gouveia, a troca é fundamental para o processo de autoconhecimento dos próprios grupos e artistas. “Está sendo muito bom esse convívio com os outros grupos, até mesmo como um espelho de si, porque se a gente não conhece o outro, não conhece a si mesmo”, disse.

A experiência da Trupe Ensaia Aqui e Acolá

As atrizes da Trupe Ensaia Aqui e Acolá começaram o papo falando sobre o início na companhia, a partir de encontros ainda na graduação em Artes Cênicas na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), sob orientação do professor Marco Camarotti. A trupe, criada em 2006, surgiu após o falecimento do professor, pela necessidade de dar continuidade aos trabalhos de pesquisa desenvolvidos por Marco Camarotti, com foco na cultura popular e nos melodramas circenses, chamado por ele de “formas marginalizadas do teatro” (teatro da infância e juventude, circo-teatro e o teatro folclórico).

 
O professor escreveu uma trilogia de livros que estão servindo de base para o desenvolvimento da metodologia de trabalho do grupo, ainda em processo de formação de sua identidade e estética teatral. “A gente tem se apoiado nas pesquisas e na obra do Camarotti pra produzir nossos espetáculos. Já estamos desenvolvendo nosso próximo trabalho apoiado no terceiro livro dele, Resistência e Voz: O teatro do povo do nordeste, no qual estamos desenvolvendo algumas pesquisas sobre a memória dos melodramas circenses”, explicou Juliana Montenegro.

A profissionalização e o processo de feitura dos espetáculos foram uns dos pontos-chave no debate. Iara Campos explicou que o próprio nome da Trupe, Ensaia Aqui e Acolá, foi uma sugestão que surgiu no grupo pela dificuldade de terem um espaço próprio para os ensaios, sempre improvisados. Embora haja ensaios regulares e intensa atividade de produção, os integrantes não têm como se manter somente com o trabalho na trupe, dependendo de outras atividades profissionais, o que acaba dificultando a realização de viagens e excursões para outros estados. Disse ainda que todo o processo é colaborativo e que os integrantes não têm uma função específica, alternando atividades a cada novo processo de trabalho. Ou seja, um diretor que em outro momento pode ser o iluminador e assim por diante.


A linguagem pelo público

Outro ponto discutido foi a respeito da linguagem direcionada pela classificação indicativa do público alvo. O ator e bailarino mato-grossense Clodoaldo Arruda questionou se o processo de criação direcionada para um público alvo não acaba engessando a fruição do espectador. “Qual a importância desse direcionamento do público, como vou direcionar a necessidade do sabor do olhar?”, questionou o bailarino.

Iara Campos respondeu explicando que, no caso do espetáculo da trupe, O Amor de Clotilde por um certo Leandro Dantas, não há como privilegiar as crianças como público alvo, pelo caráter verborrágico da peça e porque as referências que eles usaram para a construção do espetáculo, como a trilha sonora, é uma bricolagem de experiências pessoais, que acabam se assemelhando por serem da mesma geração. Porém, as crianças absorvem algumas ideias e se interessam por alguns cacoetes de cena.

Já os integrantes de Vila Tarsila, espetáculo com foco no público infantil, disseram que, embora as crianças sejam os principais receptores da peça, ela transcende a classificação indicativa da faixa etária por conta das informações mais amplas sobre a pintora, suas obras e até mesmo o movimento modernista.

A experiência maranhense

Lauande Aires, da Cia. Santa Ignorância de Artes, comentou a respeito da realidade do teatro maranhense, que passou por um tempo de ostracismo e pouca produção nos últimos 15 anos, afetando a profissionalização de muitos profissionais. “Faz pouco tempo, e isso tem mais ou menos uns 7 anos, que a gente realmente começou a ter uma produção mais constante de teatro por conta do fomento em torno dos eventos do calendário cultural da cidade. A semana de teatro é um deles. E isso tem nos motivado a produzir mais, a querer apostar em novos mercados”, disse o ator.

A companhia estará com seus espetáculos na programação do Palco Giratório do próximo ano, sendo o segundo grupo maranhense a participar do projeto do SESC. “Pai e Filho”, da Pequena Companhia de Teatro, foi o primeiro contemplado e está percorrendo o Brasil no evento deste ano.

Arte e conhecimento

A professora Socorro Braga provocou também a reflexão dos participantes no debate sobre a relação entre a arte e o mercado profissional, a motivação que conduz cada profissional a produzir seus espetáculos.

Anderson Gouveia disse que é preciso ter um gosto pelo fazer artístico, independente das dificuldades que o mercado impõe. “A gente trabalha na instabilidade dos programas e projetos de fomento. Há sempre um risco e é preciso ter gosto por essa rotina”, refletiu.

“A arte precisa ser reconhecida como moeda de valor. E mais do que uma ambição financeira, o artista tem que ser movido pela troca, num processo de recolonização, reforçando a importância da academia em relação à pesquisa teatral, e sabendo fazer uso do poder que a arte tem de fazer sucesso, o poder de fazer circular e de produzir conhecimento”, chamou a atenção Clodoaldo Arruda.

O debate foi finalizado sobre a discussão entre Arte e Ciência com todos os participantes ressaltando a importância do papel educativo e científico que a arte tem, e que cada vez mais deve ser estimulado essa troca, tanto da parte dos artistas quanto dos pesquisadores do campo das Artes


  
(Iara Campos, Socorro Braga, Juliana Montenegro e Carolina Aragão)